terça-feira, 25 de dezembro de 2012

ZÉ BODEGA

No rol dos grandes músicos brasileiros, os irmãos Araújo, liderados por Severino, ocupam lugar de destaque. A Orquestra Tabajara é referencial de qualidade. Um dos irmãos do Severino, é considerado virtuoso no sax tenor. Zé Bodega. Tão esquecido atualmente. Segue texto de Zuza Homem de Mello sobre este saxofonista único.
"Zé Bodega (1923-2003), por quem K-Ximbinho nutria admiração, foi, segundo ele, o maior saxofonista brasileiro. Os demais, saxofonistas-tenores ou não, concordam em peso e sem hesitação. Nas incontáveis gravações de que participou acompanhando cantores, ninguém se arriscava a solar depois de Zé Bodega – apelido que vem da infância, quando fingia ser o dono de uma lojinha de brincadeira, a bodega, onde “vendia” areia como se fosse sal. Com menos de dez anos de idade, imitando o pai, formou uma banda, que dirigia com um pedaço de pau pelas ruas de João Pessoa.
O mais tímido dos irmãos de Severino entrou para a Tabajara em 1942, era ótimo clarinetista, atacava as notas com meiguice e fraseava as notas graciosamente soprando quase sem vibrato, com uma personalidade identificável à primeira vista. Teria lugar na galeria dos grandes saxofonistas do jazz. Idolatrava Al Cohn, descendente em linha direta do som cool nascido com Lester Young.
Nos bailes da Tabajara teve por anos um destaque em Jealousy , mas em 1955 Severino decidiu compor um tema específico para mostrar as virtudes do irmão. Aproveitando um exercício de suas aulas de harmonia com o professor Koellreutter, com o tema Água com açúcar em três andamentos cada vez mais rápidos. Na fase dos 78 rotações ele foi solista da Tabajara em diversos choros, como Malicioso e Passou, afora frequentes intervenções na abundante discografia da orquestra. Zé Bodega é o saxofonista que se ouve na famosa gravação de Eliseth Cardoso, Canção do amor, de 1950 (…). Participou com destaque em solos curtos e sensacionais da infernal Turma da Gafieira, que gravou um célebre LP de 10 polegadas no auditório da Escola Nacional de Música, nos anos 1950.
No início dos anos 1960, o grande Zé Bodega gravou o único LP sob seu nome, Um sax no samba, acompanhado pela orquestra do irmão sem o naipe de saxofones, um disco de produção equivocada no qual ele ainda mostra sua categoria em “Palhaçada”, “Onde estava eu”, “Sambando” e “Fiz o bobão”. Em 1971 a Odeon lançou o vinil Chorinhos da pesada, com diversos solistas como Raul de Barros e Abel Ferreira. Bodega gravou pela segunda vez um choro de sua estatura como músico ao tocar com Radamés Gnatalli, “Bate-papo”. No mesmo disco, acompanhado pela metaleira da Tabajara, realiza o solo antológico do intrincado choro “Teclas Pretas” de Pascoal de Barros, o lendário saxofonista de quem não se tem notícia de haver qualquer gravação. No já mencionado espetáculo da Tabajara no Anhembi em 1977, Zé Bodega tocou o choro pela última vez. Aplaudidíssima, a performance é a faixa 5 do lado B no LP O fino da música, volume 2, gravado ao vivo. De 1977 a 1988 “Teclas pretas” foi tocado duas vezes por dia, durante onze anos seguidos, na Rádio Jovem Pan. Era o prefixo do “Programa do Zuza”.
Depois do show no Anhembi, Zé Bodega decidiu dar um tempo. Tinha pressão alta e ficara muito emocionado. Continuou tocando só na orquestra da TV Globo. até sua dissolução. Em seguida vendeu o tenor e ficou tocando flauta na sua casa de praia em Itaipuassu, em Maricá. A perda da mulher foi um golpe muito duro. Não resistiu. Quando faleceu, em 23 de setembro de 2003, foi publicada uma singela notícia sobre a morte de José Bodega(sic). Era simplesmente o maior saxofonista brasileiro. "  (Mello, Zuza Homem de, Música nas veias – memórias e ensaios , São Paulo, editora 34, 2007)

Um comentário:

  1. surpreendente,não sabia que o Severino Araújo tinha um irmão tão famoso !

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