segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Lendas Urbanas (e Rurais)

LENDAS URBANAS (e rurais)


                        Não se sabe de onde elas surgem, como surgem e como se espalham. Mas, lendas urbanas e rurais existem em todas as sociedades. Talvez o fato decorra da simples necessidade de comunicar, própria do ser humano, ou ainda da vontade de contar uma história escabrosa – há quem extraia imenso prazer disso.
                        Lembro de algumas que povoavam o imaginário da Capital na década de sessenta do século passado. A do ladrão que soprava a fumaça do cigarro de maconha , pelo buraco da fechadura da porta e entorpecia todos os moradores, era recorrente. Dizia a lenda que, após essa providência, o amigo do alheio entrava calmamente na casa, e fazia a “limpeza”. Para evitar esse desastre, havia um antídoto: bastava deixar uma bacia de água no cômodo principal da casa, e a água “puxaria” os efeitos da fumaça entorpecente. Essa técnica foi largamente utilizada por uma secretária doméstica que trabalhava na minha casa, por mais que minha mãe considerasse uma rematada bobagem. Não tinha jeito: contrariando a orientação dos patrões, depois que todos dormiam, lá ia a fiel servidora encher de água a maior bacia da casa, e colocar na sala. Engraçado é que não se questionava um fato simples: se a fumaça era assim tão forte,  como o larápio conseguia fumar sem, ele mesmo, cair prostrado? Bem, lendas urbanas não se explicam.
                        De vez em quando também surgia o boato de que tinha sido capturado um caranguejo, sim, caranguejo mesmo, em cuja carapaça havia a imagem de Nossa Senhora nitidamente gravada. Tal , era considerado, por razões que até hoje desconheço, um forte indício do fim do mundo. Sempre aparecia alguém que tinha um primo, que era amigo do cunhado do tio da pessoa cujo sobrinho tinha visto o tal caranguejo. Pessoalmente nunca tive a oportunidade de vislumbrar o abençoado crustáceo.
                        Merece ser citado um cedro que derramava lágrimas milagrosas, descoberto, salvo falha de memória, no Município de Alhandra. Rapidamente formaram-se caravanas de romeiros e o sítio onde a árvore estava entrou em clima de festa. O dono até passou a cobrar um óbolo , para cobrir as despesas – dizia, aos que pretendiam contemplar o cedro chorão. Havia quem jurasse, de pés juntos, que estava curado de muitas mazelas por ter bebido as santas lágrimas.
                        Muitas das lendas referem-se à comida e suas combinações com outras , ou horários de ingestão. Assim, não se deve chupar mangas à noite, sob pena de cair doente. Se misturar com leite, então, a morte é certa. Pode encomendar a mortalha.
                        Segundo essa lógica, alguns alimentos são “carregados” , e devem ser evitados à todo o custo. O peixe albacora é o recordista em , digamos, “carrego” , seguido de perto pelos crustáceos em geral. Só devem ser ingeridos se o vivente estiver gozando de plena saúde. A ave de arribação e a galinha d’angola ficam na faixa intermediária.
                        O bode tem uma característica peculiar: não mata o seu devorador, mas, ao longo do tempo, deixa-o mouco. É isso mesmo, carne de bode provoca surdez, reza a lenda.
                        Tendo me ocorrido esta explicação pouco ortodoxa para a perda de audição, mencionei-a (em voz bem alta) ao amigo e colega Gilson Farias, que queixava-se de estar ficando surdo, em plena Livraria de Assis, no Fórum:
                        - Mas Gilson, isso não é porque você comeu muito bode quando era juiz no interior?
                        - Não , não, respondeu, é de família mesmo. Na minha família esse problema é comum.
                        Já ia me conformando com a explicação genética para a suposta redução da capacidade auditiva do amigo, quando ele acrescenta:
                        -Agora tem o seguinte, todo mundo na minha família gosta muito de bode...
Bode

Um comentário:

  1. hahaha adorei! costumava participar da comunidade "lendas urbanas" no falecido orkut.

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